
Bairros com maioria da população preta e parda estão distantes do conceito de vida digna e segurança.
João Oliveira Santos, 35 anos, conhece o peso das adversidades enfrentadas por quem vive e trabalha em territórios de difícil acesso urbano. Entregador de aplicativos, ele nem tira a mochila das costas para falar das situações complicadas no vaivém de Cidade Tiradentes, onde mora, na zona leste de São Paulo.
Em seu trabalho, a demanda noturna é forte. A volta para casa, cheia de receios. A segurança física e a psíquica são preocupações constantes. “Eu ando pelas ruas, sim, mas com medo. Muito medo”, diz João. “Sou um homem negro, tenho 1,82 metro de altura e nunca sei o que pode acontecer. Se serei assaltado, se serei confundido com algum assaltante, se simplesmente acontecerá algo ruim comigo.”
A apreensão de João reflete a posição do bairro no Mapa da Desigualdade de 2020, da Rede Nossa São Paulo. A Cidade Tiradentes ocupa o quarto lugar no ranking dos mais violentos da capital paulista (veja a lista completa nesta página). De tudo que atormenta os moradores na região, a violência é um dos fantasmas mais presentes. O levantamento também estuda outras áreas, como mobilidade, saúde, educação, habitação, cultura, esporte, trabalho e renda.
RACISMO E EXCLUSÃO
Segundo Gladis Elise Pereira da Silva Kaercher, especialista em educação antirracista, a insegurança no modo de vida das periferias não se dá por acaso: os bairros classificados como perigosos são, na maioria, habitados por negros. Na Cidade Tiradentes, por exemplo, pretos e pardos somam 56,1% da população.
“Não tem como pensar em segurança pública sem olhar atentamente as questões raciais no Brasil”, afirma Gladis, que é professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Grande do Sul (UFRGS). “A população que sempre viveu às margens da sociedade instalou-se nesses bairros que não têm acessibilidade ou mobilidade urbana. Realocada nos extremos das cidades brasileiras, ainda convive com uma política de repressão em vez de prevenção.”
Daí a importância de olhar para a educação e os ensinamentos transmitidos nas instituições responsáveis pela segurança – as polícias. “Muitos agentes aprendem que as características negras são suspeitas e que esses bairros são suspeitos”, diz. Essa realidade só contribui para a desigualdade em todo o País.
Letícia Maria Schabbach, professora do Departamento de Sociologia da UFRGS, ressalta outro problema de fundo. Qualquer solução e planejamento em segurança pública tem de passar, necessariamente, por projetos e políticas sociais, incentivo à educação, geração de renda e promoção de cultura e lazer. “É essencial oferecer uma estrutura urbana digna, com a iluminação pública plena, a disponibilidade de serviços essenciais e saneamento básico”, diz. “Os moradores das periferias têm o direito de desfrutar a sociedade.”
OS DEZ DISTRITOS MAIS SEGUROS DE SÃO PAULO
- 1. Alto de Pinheiros
- 2. Consolação
- 3. Pinheiros
- 4. Santo Amaro
- 5. Butantã
- 6. Perdizes
- 7. República
- 8. Itaim Bibi
- 9. Jardim Paulista
- 10. Moema
Fonte: Mapa da Desigualdade 2020
OS DEZ DISTRITOS MENOS SEGUROS DE SÃO PAULO
- 1. Marsilac
- 2. Brás
- 3. Jardim Ângela
- 4. Cidade Tiradentes
- 5. Sé
- 6. Bom Retiro
- 7. Vila Medeiros
- 8. Brasilândia
- 9. Capão Redondo
- 10. São Miguel
Fonte: Mapa da Desigualdade 2020
Imagem em destaque: Michel Silva