O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, participa de audiência pública sobre a liberação de novos agrotóxicos, na Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados.

É necessário ter ouvidos atentos sempre que um político brasileiro menciona as favelas em discursos e coletivas de imprensa. Rocinha, Alemão, Heliópolis, Sol Nascente, Sussuarana. As favelas sempre atraíram políticos que não solucionaram problemas acumulados ao longo dos últimos 100 anos. Não foi diferente com Luiz Mandetta, o ministro da saúde no Brasil. 

Não foi diferente com Luiz Mandetta, o ministro da saúde no Brasil. Ultimamente, ele vem ganhando projeção pelo considerado jeito carismático de falar, a abordagem técnica dos assuntos e, por fim, parece estar nadando contra a corrente bolsonarista. Em uma das várias coletivas de imprensa, Mandetta elogiou as ações executadas por moradores de favelas em seus territórios.

“Parabéns as comunidades do Rio de Janeiro. Parabéns as favelas, as comunidades e eu as conheço. Estudei aí. Estudei aí. Fiz ação voluntária tanto ali no Vidigal, quanto na Rocinha quando eu era acadêmico de medicina. Outro dia, fui lançar o programa de doenças sexualmente transmissíveis lá na Rocinha com jovens de comunidade. Parabéns Maré, parabéns pelo trabalho que vocês estão fazendo e o exemplo de dignidade, de comportamento, de inteligência. Da aula de sabedoria que vocês estão dando. Na dinâmica, Heliópolis em São Paulo, todas elas. Paraisópolis. Todas elas. Eu falo do Rio de Janeiro porque fiquei 10 anos naquela cidade”.

Diante de uma releitura de “Vida Loka II, de Racionais MC’S – queremos te dizer: “How, how Mandetta. Acorda sangue bom, aqui é favela, tru. Não pokemón“. Parem de olhar para a favela como um filme de ficção, escutem o que temos a dizer. As favelas não querem parabéns, ministro Mandetta. As favelas querem ser tratadas com respeito e dignidade.

Nós não precisamos de parabéns porque os favelados aprenderam a se reinventar  desde a necessidade do surgimento deste solo sagrado, chamado favela. Foi assim na luta por moradia, aconteceu também na luta pela implantação da rede de abastecimento de água e energia elétrica que precariamente (não) funciona, além da luta por saneamento básico. Enquanto por 10 anos o ministro diz ter conhecido a favela durante seu estágio no curso de medicina, nossos pais, por mais de 100 anos, não tiveram acesso à educação e saúde de qualidade. Os postos médicos chegaram em algumas favelas, depois de muita luta e  anos de reivindicações. E ainda assim, até hoje, os governos insistem na estratégia de observar a favela sob a mira do fuzil.

Embora tenha muitos grupos de favelas mobilizados para combater o covid-19 nas favelas, os governantes deveriam ter vergonha de nos parabenizar pela necessidade de articulação diante de total incapacidade de ação dos órgãos oficiais. Já se passou um mês e o governo federal não apresentou nenhuma medida efetiva para as favelas brasileiras. Só se fala em isolamento social, mas desde sempre, o povo pobre e favelado foi forçado a prosseguir.

Parar nunca foi uma opção. O sentido de resistência para a favela, é seguir em frente. Se tem tiroteio na rua A, a gente segue pro trabalho pela rua B. O impacto do #COVID19NasFavelas transforma o conceito de resistência na favela. Se antes, para se manter vivo o sentido era estar em constante movimento, agora resistência significar parar, ficar em casa e se cuidar.

Subestimar a fome do povo é perigoso. A proposta da renda básica emergencial de R$ 600,00 durante três meses para trabalhadores informais, desempregados e outros vulneráveis não garante uma estabilidade se compararmos com o custo de vida por cada estado. Tem que aumentar isso aí, talkei? 

Pesquisa do Data Favela aponta recentemente que 84% dos moradores de favela acreditam que terão sua renda reduzida por conta da quarentena do coronavírus. Outros dados alarmantes apontados pela pesquisa é de que quase 9 entre 10 moradores de favela teriam dificuldades para comprar comida, caso fiquem obrigados a ficar em casa sem produzir renda. Isso pode explicar o fato de 54% estar preocupado com o risco de perder o emprego, durante a quarentena.

Se a lógica do Estado é não assumir a responsabilidade de garantir quarentena digna aos trabalhadores mais pobres, acusando adversários políticos de não se importarem com o emprego, em clara tentativa de interferir na opinião pública, volte algumas casas. É dever dos especialistas da área de saúde, como o ministro Mandetta, vacinar a parte destoante do governo para que enxerguem a necessidade urgente do isolamento e vista-se do cargo que ocupa para auxiliar ao povo. Distribuindo a renda que lhe é de direito para o enfrentamento da crise e, principalmente, garantindo que os testes para detecção do coronavírus cheguem nas unidades de saúde que realizam atendimento às favelas.

Os parabéns não são necessários, mas a coragem para agir e garantir os direitos da população mais pobre, sim.

Bastidores do FP

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