
O uso da sinalização de pronomes pode possibilitar uma melhor experiência nas redes sociais.
Na nossa sociedade, episódios de transfobias fazem parte do cotidiano de pessoas trans e travestis que lutam incansavelmente para garantir seus respectivos direitos civis e também respeito. No Dia da Visibilidade Trans o debate sobre a importância da utilização dos pronomes com o qual se identificam nas redes sociais é um assunto a ser debatido.
Recentemente a participação da Linn da Quebrada na 22ª edição do Big Brother Brasil foi marcada por diversos episódios de transfobias, com pessoas não respeitando a identidade de gênero da participante e tampouco o pronome com o qual a participante se identifica e chegou até a tatuar na testa. Com isso, surge a necessidade de falarmos sobre como transformar espaços e relações mais confortáveis e respeitosas, principalmente para pessoas trans e travestis.
De um tempo pra cá tem sido comum encontrar inúmeros perfis fazendo a utilização da parte reservada para a sua biografia como ferramenta de contenção de preconceito ou qualquer situação constrangedora. Muito provavelmente você já deve ter se deparado com esses perfis que tinha escrito os pronomes similares a “ele/dele ou ela/dela” na tentativa de direcionar um contato adequado e garantir uma experiência boa nessas plataformas.
No caso do sistema gramatical do português brasileiro, diferentemente do inglês, que tem o “their – deles/delas” ainda não há um consenso em relação a utilização de pronomes neutros dentro dessa língua, mas já existe “elu/delu” que supostamente acolheria aqueles que não se sentem contemplados dentro de um padrão binário na língua, que necessariamente faz marcação de masculino e feminino.
Para além disso, há uma lacuna que geralmente não é trazida à tona quando nos deparamos com esse tipo de debate, mas como explicar o sistema de uma língua que pode ser neutra em um país que ainda sofre com a sucateamento da educação onde grande parte da população é analfabeta. De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) em 2019 o Brasil ainda tinha o número assustado de 11 milhões de pessoas que não sabem ler nem escrever.
Conversei com uma amiga e mestre em linguística pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), professora de ensino médio da rede pública, Patrícia Guimarães, que falou sobre a importância dessa cultura nas redes sociais.
“Em relação a utilização dos pronomes nas redes sociais, acredito que é uma medida muito interessante, porque primeiramente a pessoa que sinaliza já consegue evitar um constrangimento de uma leitura errada do seu corpo, e também porque muita das vezes as pessoas não têm a consciência de tratar a pessoa no pronome correto.” afirma a professora.
A maioria das redes sociais colocam a disposição a possibilidade de um contato direto com a sua rede de amigos ou conexões que possibilitam uma leitura prévia do que você é. Em corpos trans, há a problemática ainda maior onde você só é validada com a leitura do seu corpo no gênero que você se identifica se você consegue alcançar ou não uma passabilidade (padrão de um corpo cisgnero a ser alcançado por um corpo trans).

“Uma vez que a gente entende que gênero é uma construção social, você identificar qual é o pronome da sua preferência é essencial para que você consiga situar o outro, ou a sociedade em geral, sobre como te tratar no gênero adequado. Temos o problema da passabilidade, e por isso, mais importante ainda é que a própria pessoa diga como ela quer ser chamada.” aponta a linguista.
Existe uma somatória de contextos que colaboram para uma desigualdade social ainda maior no Brasil, mas a inclusão de debates como esses em espaços não somente acadêmicos são de extrema importância não somente para uma educação direcionada sobre a temática, mas também na redução no número de casos de preconceitos e no combate do apagamento de corpos que não pertencem a uma normal cisgenera e heterosexual.
“A grande problemática desta sinalização nas redes sociais continua sendo o preconceito da nossa sociedade em termos gerais, porque ainda estamos falando sobre em como tratar o outro e pode acontecer de parte dessa sociedade não aceitar. O que se torna um problema, em especial as pessoas trans binárias ou não, que fazem a questão de sinalizar o pronome adequado justamente para ter uma melhor qualidade de vida. Isso fica explícito quando me deparo com preconceitos linguísticos ou não sobre a questão do gênero neutro, por exemplo.” desabafa a Patrícia Guimarães.
Ainda na tentativa de trazer um panorama geral sobre a utilização dos pronomes nas redes, conversei com Juan Carlos, 24 anos, graduanda de meteorologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e trans não binária que faz a utilização dos pronomes nas redes sociais e sinaliza que tem preferência para que se refiram a ela por pronomes femininos.
“Olha, eu acho importante essa sinalização independente de a pessoa ser trans ou cis. Isso ajuda muito na hora de se comunicar com alguém, justamente para não rolar desrespeito e também acho que incentiva a galera perguntar os pronomes dos outros quando não tiver nada escrito.” aponta a graduanda.

Corpos trans sofrem com o apagamento em diversas esferas dentro da nossa sociedade, mas, pode parecer um processo difícil, porém, toda língua é capaz de mudar e para que isso ocorra é necessário somente que a nossa sociedade comece a utilizar as palavras que podem e devem ser acrescentadas no nosso cotidiano, afinal, já passou do tempo, não é?
Entenda os termos:
Cisgêneras: pessoas que nasceram em um corpo biológico que corresponde a sua identidade de gênero.
Não binária: pessoas que não se identificam com a identidade gênero feminina nem a masculina.
Trans: pessoas que nasceram em um corpo biológico que NÃO corresponde a sua identidade de gênero e precisam passar por um período de transição para adequar o corpo ao gênero.
Passabilidade: conceito cisgênero que consiste na entrega de um padrão na expectativa binária do que é ser macho/fêmea ou homem/mulher.
Post atualizado em 29/01/2022, às 12:30.
Fotos: Divulgação / Fotos Redes: Divulgação BBB22
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