No último domingo, 20, dia de tensão em toda a cidade do Rio de Janeiro ao encarar fortes chuvas após um período de seca, a Regional Administrativa Realengo, além de lidar com enchentes, alagamentos, quedas de luz e dificuldades de locomoção, assistiu a uma perda material e simbólica imensa: a Clínica da Família Armando Palhares Aguinaga, nossa Clínica da Família de Realengo, localizada na Av. Santa Cruz, teve uma parte de suas instalações incendiadas após um raio cair no local e um curto ser gerado devido também ao fluxo de água da enchente. Não houve vítimas e o fogo atingiu principalmente a recepção e a área de vacinação da clínica.
O fogo, entretanto, sabemos que vem pegando há algum tempo na região. De acordo com dados da Secretaria Municipal de Saúde, divulgados pelo G1, a Clínica da Família de Realengo realizava cerca de 530 atendimentos por dia e tinha mais de 18.300 pacientes cadastrados. Como pode um equipamento tão relevante para a população local estar sucateado e com as estruturas comprometidas a esse ponto? É fogo.
Inclusive, em um dos encontros do Curso de Políticas Públicas, promovido no bairro pela equipe da Agenda Realengo 2030, debatemos sobre a importância da valorização dos serviços e servidores da saúde pública municipal. Nas mídias, com facilidade, você encontra a luta desses trabalhadores, já que os servidores da Saúde têm o menor salário do Rio. No cotidiano, quem depende e conta com o SUS diariamente encontra percalços ocasionados pela precarização do serviço. A quem interessa manter unidades de saúde em territórios onde habita a classe trabalhadora nessas condições? O fogo veio. Não é por acaso. Não é só pela chuva.
Aliás, sobre as chuvas, vale ressaltar que os rio Catarino e Piraquara seguem com processos de desassoreamento atravancados, bueiros e cantos de Realengo seguem entupidos de lixo, as ruas seguem cheias de buracos e desniveladas e tudo isso contribui, dentro de um cenário de aceleradas mudanças climáticas, para um resultado cada vez mais catastrófico quando chove. É devido ao descaso com planejamento urbano e com as medidas recomendadas para que a nossa casa, o planeta Terra, possa seguir nos abrigando, que a gente fica com medo toda vez que o céu escurece.
O prefeito Eduardo Paes, que não veio em nenhuma das reuniões públicas do ano passado pela construção do Parque Realengo Verde, rapidamente apareceu na porta da clínica com as chamas recém controladas. Não podemos nos esquecer que ele insiste, junto a Secretaria do Meio Ambiente e em acordo com os militares, a ceder somente 50% da área de 142.000m² para a implementação do parque – mantendo um condomínio residencial fechado que em nada é útil diante do cenário que o bairro apresenta de crescimento de população, ausência de verde e conflitos urbanos. Na sua fala oficial, garantiu a reforma da Clínica da Família e pediu pra gente se cuidar. Mais uma vez, ao acaso e ao relento, fica a população de Realengo. O fogo pega pra gente todo dia. E o fogo em nossos sonhos ainda é utilizado para ser fundo de campanha do Dia do Orgulho SUS, como proposto pelo Secretário de Saúde do Rio de Janeiro Daniel Soranz em suas redes sociais.
Falando nisso, vale ressaltar que a Zona Oeste Mais faz, com aval da Prefeitura, a área citada onde sonhamos o Parque Realengo Verde de bota fora para entulho, degradando a memória da antiga Fábrica de Cartuchos. Essa mesma empresa, quem mora sabe, não presta um serviço decente para a Zona Oeste – que representa 48% do Território da Cidade (AP.5). São 457 anos de Rio. 207 anos de Realengo. Dois mandatos de Eduardo Paes e agora o terceiro…
O que mais precisa incendiar para a Zona Oeste receber a devida atenção?
Estamos atentos e atentas. Não vamos aplaudir atitudes mínimas, que sabemos que se apoiam na promoção da imagem devido ao ano eleitoral. Queremos atenção, cuidado, diálogo e reformas em nossos equipamentos de saúde, de cultura, praças públicas, escolas, saneamento, transporte e tudo aquilo que é essencial e DIREITO nosso. Não queremos mais políticos em Realengo somente para lamentar nossas perdas ou para fingir que temos voz em debates vazios e entregues a negociações onde nunca entendemos os verdadeiros interesses. Realengo tem voz sim, como dizem, e essa voz são várias vozes gritando em toda a Zona Oeste por um parque 100% verde em 100% do terreno.
Parque Verde que é bom – nada! Mas o fogo… Só cresce!
Ainda segundo o G1, a expectativa da Secretaria Municipal de Saúde é que a unidade de saúde volte a funcionar em 60 dias e que em 4 meses tenha a estrutura completamente recuperada. Estaremos de olho.
Veja abaixo as falas do prefeito do Rio, de seu secretário de saúde e também um registro do momento em que a unidade esteve em chamas.
Artigo por Marcele Oliveira, cria de Realengo, produtora e comunicadora cultural, dentro do quadro #AgendaRealengoComenta, da Agenda Realengo 2030. @agendarealengo2030.