Foto: Michel Silva/Favela em Pauta

O ministro da Defesa, Raul Jungmann anunciou em julho de 2017 que as favelas do Rio de Janeiro iriam receber uma série de ações sócio-educativas para combater o crime organizado na cidade. Seis meses depois, com dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação, o Favela em Pauta mostra como será executado o pacote de propostas e soluções através do Plano Nacional de Segurança no estado.

O Rio de Janeiro é o primeiro Estado a receber as ações integradas do Plano de Segurança Nacional para combater a criminalidade. De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), foi criado um Plano Emergencial com o objetivo de recuperar e fortalecer políticas públicas e equipamentos sociais do Estado e do Município em favelas vulneráveis prioritárias. Dessas discussões surgiu o Programa Emergencial de Ações Sociais para o Estado do Rio de Janeiro e seus Municípios. Segundo o MDS, o programa visa “restituir aos moradores das regiões afetadas o amplo acesso aos bens e serviços públicos da área social, de maneira a resgatar a cidadania e os vínculos sociais, familiares e comunitários.”

O programa atuará na ampliação de políticas sociais de proteção social básica e especial, atenção à saúde, oferta de atividades educacionais, formação e qualificação profissional, atividades culturais, artísticas, esportivas e de lazer. Também há previsão de atuação na proteção de direitos humanos e garantia dos direitos das mulheres.

Para administrar todas essas promessas, foi criado um Comitê- Executivo composto pelos seguintes órgãos: Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), que o coordenará; Secretaria de Governo da Presidência da República; Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão; Ministério da Educação; Ministério da Saúde; Ministério da Defesa; Ministério da Cultura; Ministério do Esporte; Ministério da Justiça e Segurança Pública e Ministério dos Direitos Humanos.

Foram totalizados R$ 157 milhões para as ações do Plano Emergencial por meio do orçamento federal de 2017. O objetivo é beneficiar cerca de 50 mil crianças e adolescentes de 6 a 17 anos de diferentes favelas no estado. Esse recurso é oriundo da abertura de créditos orçamentários de cada órgão envolvido no Comitê-Executivo. A verba será aplicada a partir dos Planos de Trabalho, de forma a garantir os meios necessários para as ações sócio-educativas.

Cada ministério terá autonomia nos repasses ao Estado e Municípios. Por exemplo, o Ministério do Desenvolvimento Social fará repasses de R$ 42 milhões por meio do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS).

Já o Ministério da Defesa (MD) aplicará a verba de R$ 30,2 milhões diretamente por meio das Organizações Militares do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. O número de beneficiários do programa “Forças no Esporte” será ampliado para atender a faixa etária de 12 a 18 anos no contraturno escolar. O objetivo será reduzir a violência urbana com desenvolvimento de atividades esportivas educacionais e alimentação em organizações militares.

O Ministério do Esporte patrocinará as ações por meio de Termo de Execução Descentralizada para a Universidade Federal Fluminense e também fará repasses ao município por meio de convênios para a ampliação dos projetos pilotos “Esporte e Cidadania para Todos” e “Práticas Corporais de Lazer, Lutas e Artes Marciais”, além do programa Luta pela Cidadania.

Responsável pelo terceiro maior orçamento do Plano Emergencial, o Ministério da Educação repassará cerca de R$ 35,4 milhões por meio do Programa Dinheiro Direto na Escola e oferta da Bolsa-Formação no âmbito do PRONATEC. Em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), um recurso de R$ 2,5 milhões será enviado para identificar potenciais alunos da educação básica regular das redes municipal e estadual do Rio de Janeiro (capital e região metropolitana) que estão fora da escola, para que eles sejam matriculados e voltem a frequentar as aulas.

A Secretaria Nacional de Juventude e o Ministério da Justiça e Segurança Pública não detalharam como serão feitos os repasses ao Estado e aos municípios.

O presidente da república, Michel Temer, realizou um discurso no fim do ano passado durante a cerimônia de lançamento do Programa Emergencial, no Centro de Educação Física Almirante Adalberto Nunes (CEFAN), para exaltar sua aliança política com governantes cariocas. “Eu quero também, embora tenha um discurso escrito aqui, Pezão e todos os oradores, eu estou inspirado pelas palavras daqueles que aqui discursaram. E ao discursarem, eu sempre procuro encontrar uma palavra chave para solenidade de que participo. E acho que a palavra chave aqui é integração.”, disse Temer.

O Programa Emergencial de Ações Sociais para o Rio de Janeiro tem investimento total de R$ 157 milhões. Foto: Marcos Corrêa/PR

Em entrevista a emissora CNT, o presidente da Federação de Favelas do Estado do Rio de Janeiro (FAFERJ), Rossino de Castro, avalia que o programa é mais um projeto político visando as eleições de 2018. “Sempre que na época de eleição, eles vem com esse programa fraco que não resolve, é paliativo para as comunidades. E a gente não quer paliativo. A gente quer coisas concretas, a gente quer o social porque o social é um trabalho que ajuda muito a comunidade. Ajuda a combater a violência, ajuda a empregar os pais de famílias que estão dentro das comunidades a toa sem fazer nada. Mas infelizmente sem esse social a violência cresce dia a dia”, lamenta Rossino.

A prioridade do Programa Emergencial, com base nos dados do Instituto de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, são as favelas localizadas em parte da zona norte e oeste da cidade do Rio de Janeiro por possuírem os maiores índices de letalidade ligada aos episódios de violência. Com base nos diagnósticos realizados pelas equipes do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), as favelas que devem receber as ações e investimentos são: o Complexo do Lins, Complexo do Alemão, Complexo da Penha, Complexo da Maré, Cidade de Deus, Complexo do Chapadão, Complexo da Pedreira e Vila Kennedy. Esses territórios são atendidos por oito Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e seis Centros de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS).

O MDS também incluiu a favela da Rocinha, na zona sul do Rio; o Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo e Baixada Fluminense, porém não soube especificar quais regiões da Baixada Fluminense seriam atendidas tendo em vista o tamanho geográfico dos municípios.

Para o sociólogo do Instituto Raízes em Movimento, Alan Brum Pinheiro, o programa emergencial aparentemente vem reforçar as ações públicas já existentes precariamente, focando em alguns espaços de favelas no Rio de Janeiro. Segundo ele, sem uma gestão pública municipal e estadual eficiente e falta de visão estratégica para pensar o mínimo de sustentabilidade pode tornar o investimento de R$ 157 milhões em uma espécie de “enxuga gelo”. “Muitas instituições e grupos, formais e informais, estão construindo alternativas micro e algumas com certo êxito. Esses investimentos deveriam agregar as iniciativas existentes, dando escala à estas, com as políticas públicas. Quem irá continuar nesses territórios após o período desse plano? Esse ano é eleitoral e os investimentos são necessários, como equacionar? Somente envolvendo uma diversidade de ações e monitoramento com controle social poderia ser capaz de alcançarmos algum êxito nessa proposta”, questiona Alan Brum.

O baixo investimento na Secretaria Nacional de Juventude – cerca de R$ 2,6 milhões – também foi criticado por Brum. “É insensato nessa proposta o menor investimento ser justamente na Secretaria Nacional de Juventudes e no projeto ‘Juventude Viva’ que tem o foco na juventude negra. Isso não ajuda a consolidar as políticas públicas voltadas para esse público especificamente”, lamenta ele.

O Favela em Pauta procurou o governo do estado a respeito de quando iria começar a aplicar a verba dos repasses e como seria aplicada. Em resposta, recomendaram procurar o Ministério das Cidades. Por telefone, a assessoria do Ministério das Cidades negou participação no Programa Emergencial de Ações Sociais para o estado do Rio de Janeiro. O governo do estado não respondeu mais nossos e-mails.

Procurada, a Casa Civil da Prefeitura do Rio de Janeiro não respondeu nossos questionamentos até o fechamento da matéria.

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